João Paulo Guerra (1942-2024)

João Paulo Guerra. Créditos: Antena 1

É com muita tristeza que a Direção do Clube de Jornalistas comunica a morte de João Paulo Guerra. Uma vida inteira dedicada ao jornalismo, foi prémio Gazeta Reportagem por duas vezes, recebendo ainda o Gazeta de Mérito e o prémio Igrejas Caeiro.

João Paulo Guerra, amigo querido de tantos de nós, companheiro de muitas lutas, um dos nossos melhores e grande amigo do Clube.

Uma vida profissional sempre do lado certo, desde a Rádio Renascença até à Antena 1 – e cruzámo-nos primeiro na Telefonia de Lisboa, depois na TSF mais demoradamente, na Central FM e finalmente na Antena 1 – na escrita desde a Mosca, do Diário de Lisboa, à Coluna vertebral do Diário Económico.

Não estava à espera que fosse a última vez que estaríamos juntos na visita que lhe fiz há dias. As “Viagens com Livros” e “O Regresso das Caravelas”, que lhe valeram dois Gazeta, mostraram como era possível contar tudo na rádio.

O João Paulo é uma daquelas pessoas com quem se pode contar sempre. Estava sempre onde onde era preciso e com o acerto da palavra, tantas vezes irónica outras tantas divertida e sempre mordaz.

Todos fazemos falta, mas há quem faça mais falta que outros. A mim o João Paulo vai fazer-me muita falta e a todos nós no Clube de Jornalistas também. 

Maria Flor Pedroso 
Presidente do Clube de Jornalistas 
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Cerimónias fúnebres Velório, dia 5 de agosto, a partir das 18h30 na capela da Igreja de Santo Condestável (em Campo de Ourique). Dia 6 de agosto, saída para o Alto de S. João às 15h00, para cremação às 16h00.

Algumas mensagens de outros jornalistas

“Já sabíamos que o tempo é implacável, mas nunca estamos verdadeiramente preparados para o momento em que as grandes vozes se calam para sempre. Cabe-nos a nós manter viva a memória e o legado deste gigante das ondas sonoras e da palavra escrita. Certa vez, com a generosidade que lhe era característica, o João Paulo Guerra disse-me para continuar a fazer ‘a rádio mais bonita que ouvimos’. Continuemos, João. Obrigada.”
– Rita Colaço, jornalista da Antena 1

“Comecei a ouvi-lo, mas sobretudo a lê-lo em miúdo, nos jornais que andavam lá por casa, com “o diário” à cabeça. E nunca mais deixei de lê-lo. Disse-lhe em vida o que toda a vida lhe quis dizer: quando for grande quero ser como tu. Por isso, quando, em abril de 2017, ele aceitou apresentar o meu livro ‘Quando Portugal Ardeu’, na Barraca, em Lisboa, sublinhei ainda mais essa dádiva: ‘Foi contigo que este bichinho do jornalismo se fez grande. Não só pelas reportagens, mas sobretudo por causa de um livro chamado Polícias & Ladrões, da Editorial Caminho, que reunia já algumas das histórias que desenvolvo no meu livro. É uma felicidade, uma honra e um privilégio que a minha geração tenha tido o teu exemplo como inspiração. Nunca te estaremos suficientemente gratos por isso.’ Nos anos que se seguiram, esteve sempre disponível para mim. E ainda fui a tempo de incluir as suas memórias e histórias sobre a música e a política na ‘minha’ Amália.
Muitos dos seus textos permanecem vivos e podem lê-los aqui: http://especiedemocracia.blogspot.com/
Obrigado, camarada João Paulo Guerra! Esta tristeza vai demorar a apagar-se…”
– Miguel Carvalho, jornalista freelancer

“Há momentos em que todas as palavras são inúteis. Nenhuma palavra consegue preencher o vazio deixado por alguém que parte. Para sempre. Nenhuma palavra consegue eliminar o efeito demolidor de uma ausência. O João Paulo Guerra partiu. Há uma tristeza infinita a condicionar o simples enunciar desta verdade de que tomei conhecimento há momentos. Trabalhámos juntos na redação de O Diário. Eu, quando o João Paulo chegou, ainda à procura de um rumo e de uma identidade jornalística. Ele já um mestre cujas pisadas ambicionávamos seguir. Impossível. O João Paulo Guerra era único. Até sempre, camarada.”
– Valdemar Cruz, jornalista do Expresso

“Um grande profissional, tanto na rádio como nos jornais, com vários livros publicados (casos de “Memórias das Guerras Coloniais, Savimbi – Vida e Morte”, “Diz que é uma espécie de democracia”,” Descolonização Portuguesa – O regresso das caravelas” e “Romance de uma conspiração”), além de talentoso guionista televiso (e.g., no documentário “Memórias das Guerras Coloniais”) e uma excelente incursão no teatro com a adaptação do romance “Clarabóia”, de José Saramago, em cena n’ A Barraca, em 2015.
E foi o mais brilhante provedor do Ouvinte da rádio pública, de 2017 a 2021 (autênticos programas de rádio, como ainda se podem reouvir na RTP Play, até para se comparar com o cizentismo atual…).
Homem da rádio já antes do 25 de Abril, foi dele a expressão “nacional-cançonetismo”, que cunhou pela primeira vez em 1966 na rubrica “POPularucho” do suplemento “Mosca” do “Diário de Lisboa”, numa sátira acutilante ao estilo musical dominante à época e em contraponto com a qualidade da emergente música de intervenção de José Afonso, José Mário Branco e Sérgio Godinho, entre outros, que mal passavam então pelo crivo da censura.
Fica a admiração e a saudade pela sua partida.”
– José Mário Costa, jornalista, cofundador do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

“Rigor, isenção, seriedade, credibilidade, objectividade, frontalidade, coragem, sentido de humor, inteligência, educação e cultura geral.
Morreu um dos mestres com quem tive a honra e o privilégio de trabalhar e de aprender.
Muito.
Ele que nunca teve a pretensão de ensinar.
O jornalismo fica ainda mais pobre.”
– António Esteves, jornalista da RTP

“Quando eu comecei nos jornais, o João Paulo Guerra era um velho do Diário Económico. Era um velho porque tinha uns distantíssimos cinquenta e tais, e os cinquentas são uma inconcebível Sibéria no mapa de quem está no trópico dos vintes. Ora, nem eu nem metade da juveníssima redação do Diário Económico tínhamos metade dos anos dele, nem, diga-se, metade de metade do seu saber – ou do seu sabor. Porque ele tinha sempre sabor, de ácido como as pilhas a suave como os mares das ilhas, ter sabor é não ser anódino nem montra de joalheria, e o João Paulo escrevia, como sói dizer-se, ‘de gancho’.” (…)
Sou um mau biógrafo do João Paulo, até porque só o li a partir do seu mais de dobro da minha idade, já ele havia sido jovem, já ele escrevera obra, carreira e ativismo, peço desculpa por não vo-las relatar, mas este texto não é sobre isso, é só um canto de um leitor e por isso vos digo que o li todos aqueles anos, como depois o ouvi na revista de imprensa todas manhãs na Antena 1, um primor de jornalismo e de rádio como ninguém –  ninguém – soubera nem saberia fazer simile. Mais tarde, ele continuaria em publicar em blogues, onde assinava como ‘João Paulo Guerra. Jornalista há: 20 primeiros ministros, 11 PR’s e 8 Papas’. A contagem ficaria desatualizada até à publicação do último texto, já nos seus oitentas.”
– Pedro Santos Guerreiro, diretor da CNN Portugal / Ler crónica completa: “Um brinde a ti, Guerra!”